(in https://www.iwm.org.uk/)
Aspecto de Nagasaki alguns dias após a detonação da bomba atómica, a 9 de Agosto de 1945.
Às 11h:02 (hora local) daquele desditoso dia, uma segunda bomba atómica (de plutónio), apelidada de "Fat Man", foi lançada sobre outra cidade do Japão, Nagasaki. Embora aquela bomba fosse mais potente do que a "Little Boy" (de urânio-235), a destruição causada foi menor do que em Hiroxima devido à orografia acidentada (o alvo previsto era a cidade de Kokura, mas, ao deparar-se aí com um espesso manto de nuvens naquela manhã, o major Charles W. Sweeney, piloto do B-29 chamado Bockscar que transportava a bomba, resolveu rumar para Nagasaki, mais a sudoeste da ilha de Kyushu). Mesmo assim mais de 5 quilómetros quadrados da cidade foram pulverizados e cerca de 73 mil pessoas morreram.
Charanga, Construção e Pedra d'Hera são os nomes de três bons grupos que se estrearam, discograficamente, em 1982 e cujos trabalhos, parafraseando Mário Correia (in "Música Popular Portuguesa: Um Ponto de Partida", Centelha/Mundo da Canção, 1984, p. 301), se enquadram na via ampla que foi aberta pelas propostas de síntese elaboradas pelo Trovante, sobretudo patentes em "Baile no Bosque" (1981). «O ponto da partida permanece o mesmo: a música tradicional funciona como referência musical de base, a partir da qual se incorporam influências diversas, com maior ou menor incidência em termos de resultado final, sem que qualquer dos elementos integrados na síntese criativa surja com predomínio sobre os restantes em termos limitativos. O que, acentue-se uma vez mais, tem muito a ver com a riqueza e a variedade da música tradicional.» (ibidem)
À distância de mais de quatro décadas, podemos rotular tal abordagem estético-estilística de folk progressivo português. No álbum do grupo Pedra d'Hera, de título homónimo (nome tomado de um miradouro no monte de São Brás, a 760 metros de altitude, na vertente norte da serra da Gardunha), vem, a fechar o lado A do LP, uma canção primorosa e ao mesmo tempo inquietante: "Nagasaki, Hiroshima". E o dia de hoje em que se completam 80 anos sobre o lançamento da segunda bomba atómica sobre uma cidade populosa, reeditando-se (intencionalmente) o ainda bem recente holocausto de Hiroxima, afigura-se uma excelente ocasião para resgatarmos aquele tocante trecho poético-musical, com letra, música e voz de José Reis Fontão, cujo arranjo é de raro e superlativo encanto. Estamos muito em crer que aqueles que aqui vierem ouvi-lo (a maioria deles pela primeira vez, é de supor) comungarão de tal apreciação e alguns até não deixarão de inquirir os seus botões: «Porque é que nenhuma rádio me deu a conhecer antes esta preciosidade? Para que servem, afinal, as Antenas 1 e 3?».
Nota: O grupo Pedra d'Hera voltou a gravar "Nagasaki, Hiroshima" no seu terceiro álbum, "Ventos" (1996), com um arranjo consideravelmente diferente (mais americano e menos japonês) que é rematado com o estrondo ribombante do engenho atómico em explosão [>> YouTube].
Letra e música: José Reis Fontão
Intérprete: Pedra d'Hera* (in LP "Pedra d'Hera", Promusix, 1982; CD "Pedra d'Hera I/II", Pedra d'Hera, 1994)
[instrumental]
Há tanto tempo, sr. Presidente,
Que eu ouvira falar
A um "velho branco"
Que se punha a cantar
... Nagasaki, Hiroshima...
Uma canção, que não sabia
Onde ela iria começar
Como estas bombas
Que chovem sem parar
... Nagasaki, Hiroshima...
[instrumental]
Sei que a cantava
Olhando pr'além de tudo
Quanto o rodeava...
Ah! Velho louco que cantava e chorava
... Nagasaki, Hiroshima...
Diga-me, sr. General e Chefe,
Nosso "guia poderoso",
Se esse homem idoso
Soubera o que foi
... Nagasaki, Hiroshima...
[instrumental / vocalizos]
* Pedra d'Hera:
José R. Fontão – voz e guitarra solo (introdução)
José Emílio Martins – guitarra de 12 cordas solo, pratos e caixa
Carlos J. Branco – baixo e guitarra de 6 cordas
Músico convidado:
Dino – piano Fender
Capa do LP "Pedra d'Hera", do grupo Pedra d'Hera (Promusix, 1982)
Criação e execução – Miguel Monteiro
Capa da compilação em CD "Pedra d'Hera I/II" (Pedra d'Hera, 1994)
Produtor – António Salvado (Tó-Nô)
Capa do livro "Música Popular Portuguesa: Um Ponto de Partida", de Mário Correia (Col. Cantares de Amigo, N.º 1, Centelha/Mundo da Canção, Abr. 1984)
Concepção – Arlindo Fagundes.
(in https://www.iwm.org.uk/)
Aspecto de Hiroxima alguns dias após a detonação da bomba atómica, a 6 de Agosto de 1945. A cúpula do Genbaku Dome, edifício que se mantém em ruínas para funcionar como memorial, foi o ponto de referência do coronel Paul Tibbets (1915-2007), piloto do bombardeiro B-29 baptizado de Enola Gay (em homenagem à sua mãe), para largar a bomba chamada "Little Boy" (64 kg de urânio-235), que explodiu a cerca de 550 metros acima da cidade. Com uma potência equivalente a cerca de 12,5 quilotoneladas de TNT, a bomba reduziu a cinzas uma área de 13 quilómetros quadrados do centro de Hiroxima e causou a morte a aproximadamente 70 mil pessoas nos primeiros quatro dias após a explosão, estimando-se que, posteriormente, outras tantas tenham morrido devido a complicações e a doenças causadas pela exposição a níveis elevados de radioactividade, designadamente leucemia e outros tipos de cancro.
Faz hoje 80 anos que a mais mortífera e devastadora das armas – a bomba atómica – foi lançada sobre a urbe nipónica de Hiroxima, na extremidade sudoeste da ilha de Honshu. Para descrever cabalmente tamanha catástrofe, ademais sendo antropogénica, que se traduziu na destruição repentina e intensa de uma cidade e na dizimação da maioria dos seus habitantes, parece não haver palavras à altura. Mas houve quem se esforçasse por encontrá-las e uma dessas pessoas foi o músico/compositor e artista plástico José Luís Tinoco, quando concebeu, no âmbito do seu grupo Saga, o álbum "Homo Sapiens" (1976), um dos trabalhos de referência do rock progressivo português. O poema intitula-se precisamente "Hiroxima" e, para dar-lhe voz, o autor convidou o actor Sinde Filipe. E o resultado é tocante e eloquente, desde a moldura sonora à mui impressiva recitação. Oxalá a escuta deste admirável registo pudesse fazer crescer o repúdio às armas nucleares tão ampla e arreigadamente que os dirigentes dos países que as possuem nem sequer ponderassem alguma vez usá-las!
Vem a propósito chamarmos a atenção, uma vez mais, para a gritante lacuna de uma rubrica, emitida diariamente ou de segunda a sexta-feira, de poesia dita/recitada, que persiste na grelha da Antena 1, e na qual gravações como a ora destacada pudessem ser divulgadas. Deploravelmente, Nuno Galopim de Carvalho optou por uma conduta autista ignorando sobranceiramente os apelos que o escrevente destas linhas e outros ouvintes lhe fizeram, para que tal lacuna fosse colmatada, em linha com a mui honrosa tradição do canal naquela modalidade cultural. Agora que a direcção de programas mudou de mãos (e bem), fazemos votos de que o novo homem forte da Antena 1, Nuno Reis, tenha a clarividência e a sageza de proceder de maneira diferente e mais consentânea com as obrigações de serviço público às quais o canal generalista da rádio do Estado está legal e moralmente vinculado.
HIROXIMA
Poema e música: José Luís Tinoco
Intérprete: Saga* com Sinde Filipe [in LP "Homo Sapiens", Movieplay, 1976, reed. M2U Records (Coreia do Sul), 2002]
6 de Agosto de 1945
8 e um quarto da manhã.
Já premiste o botão
que fez descer 100 milhões de graus centígrados-morte
e erguer da terra um belo clarão
enorme e deslumbrante.
Missão cumprida.
Espera-te um país reconhecido
e mais tarde
os pés no vazio
quando souberes que
em poucos segundos, sob as tuas asas,
desde as ruas e jardins do centro
até aos campos em redor,
homens, mulheres, crianças e animais
foram varridos por um vento
que pulverizou tudo o que encontrou no seu caminho,
que alguns sobreviveram gritando queimados de morte
entre cinzas e cascalho,
que os arrozais perderam a verdura
e a relva ardeu como palha seca.
Número total de mortos: cerca de 70 000.
Um belo clarão...
Um belo clarão...
enorme, sábio, deslumbrante.
A teu lado alguém pergunta:
Meu Deus, que fizemos?...
* [Créditos gerais do disco:]
Saga (instrumentistas):
José Luís Tinoco – piano, piano eléctrico, sintetizador, órgão, guitarras de 6 e 12 cordas
Zé da Ponte – viola baixo, guitarras de 6 e 12 cordas
Fernando Falé – bateria
Participação de:
Vasco Henriques – sintetizador Moog e flauta
Rão Kyao – saxofones tenor e soprano
Fernando Girão – percussão
Sinde Filipe – voz (recitação)
(in https://radio.hypotheses.org/4138)
Os actores Carmen Dolores e Jaime Santos numa sessão de gravação de teatro radiofónico – fotografia publicada na revista "Flama", 16 Mai. 1958.
A 4 de Agosto de 1935 foi inaugurada oficialmente, com a presença do presidente da República de então, Óscar Carmona, a Emissora Nacional de Radiodifusão. Porém, não foi naquela data que se deu a primeira emissão. Em regime experimental, é certo, as emissões em onda média haviam começado na Primavera de 1932 e em onda curta no ano de 1934. A inauguração da rádio do Estado (que já vinha tarde, ante a pujança de várias emissoras privadas que emitiam desde o início da década de 1920 – em 1923 fora criada a Sociedade Portuguesa de Amadores de Telefonia sem Fio) chegou a estar prevista para 28 de Maio de 1934, dia que era obviamente caro ao regime ditatorial, conforme se pode ler na notícia da publicação "Rádio-Ciência", de Maio de 1934, dirigida pelo conceituado jornalista Álvaro Contreiras [cf. artigo "Manual de aceitação da Emissora Nacional em 1934", do Prof. Rogério Santos]. Foi nesse período experimental que começou a produção e emissão em directo de teatro radiofónico na rádio oficial (nas privadas Rádio Graça, Rádio Luso e Rádio Clube Português essa nobre arte já tivera lugar). Segundo refere Eduardo Street, no seu livro "O Teatro Invisível: História do Teatro Radiofónico" (Página 4, 2006, p. 34), foi com "A Ceia dos Cardeais", peça em 1 acto da autoria de Júlio Dantas, que a Emissora Nacional deu início, a 28 de Agosto de 1934, à transmissão de teatro concebido expressamente para a rádio. O elenco era o seguinte: Alexandre de Azevedo (Cardeal Gonzaga), Henrique de Albuquerque (Cardeal Ruffo) e Samwel Diniz (Cardeal Montmorency). E os ouvintes gostaram tanto que muitos deles se deram ao cuidado de escrever e telefonar para a Emissora Nacional a pedir a reposição da mais conhecida obra dramática de Júlio Dantas. E foram atendidos: aconteceu a 18 de Setembro de 1934, dessa vez com António Sacramento no papel do cardeal francês [cf. artigo "Emissora Nacional: 1934? 1935?", de Rogério Santos]. Esse mês de Setembro de 1934 ficou também assinalado pelo início das emissões regulares da Emissora Nacional, sob a presidência do capitão Henrique Galvão em regime de comissão instaladora, por nomeação do ministro das Obras Públicas e Comunicações, Duarte Pacheco. E o teatro invisível, como o denominou Eduardo Street, logo conquistou os favores do público-ouvinte, tornando-se, nas décadas subsequentes, sob a avalizada direcção de Virgínia Victorino (usando o pseudónimo de Maria João do Valle), de Alice Ogando, de Samwel Diniz, de Álvaro Benamor, de Edgar Marques, de António Manuel Couto Viana, de Raul de Carvalho, de Fernando Gusmão, de Norberto Barroca, de Rogério Paulo, de Carlos Avilez, de Fernando Curado Ribeiro, de Filipe La Féria, de Eduardo Street, e de outros, a mais relevante modalidade de divulgação cultural da rádio pública, ao facultar inumeráveis textos de teatro (e também obras romanescas adaptadas) a tantos ouvintes residentes em lugares onde o teatro convencional não chegava, muitos deles analfabetos ou semi-analfabetos.
Neste dia em que se comemora o 90.º aniversário da inauguração oficial da rádio pública, fazemos questão de render homenagem a todos os homens e mulheres que estiveram ligados ao teatro do imaginário – autores, adaptadores, actores e seus directores/ensaiadores, locutores/narradores, técnicos de gravação, sonorização e montagem, produtores, realizadores – e aproveitamos o ensejo para deixar expresso o pedido à administração da empresa Rádio e Televisão de Portugal para que empenhe seriamente na disponibilização online do muito que ainda falta do acervo radiofónico da arte de Talma. Pedido que é extensivo aos espólios integrais de outros dois programas de absoluta referência na História da Rádio Portuguesa e detentores de valor cultural/documental perene e elevado: "Lugar ao Sul", de Rafael Correia, e "Questões de Moral", de Joel Costa.
Capa da 1.ª edição do livro "O Teatro Invisível: História do Teatro Radiofónico", de Eduardo Street, pref. Ruy de Carvalho (Col. Antestreia, vol. 7, Lisboa: Página 4, 2006)
Capa da 2.ª edição do livro "O Teatro Invisível: História do Teatro Radiofónico", de Eduardo Street, pref. Ruy de Carvalho (Lisboa: Glaciar, 2023)
Florência nos inícios da década de 1970 – fotografia publicada na capa do EP "Poema do Meu Anseio" (Orfeu ATEP 6449, 1972) e na capa da compilação em LP "Florência" (Orfeu SB-1061, 1973).
Não é raro intérpretes da canção ligeira competentes e dotados de bela e expressiva voz granjearem popularidade através de espécimes que, embora não sendo de deitar fora, não se incluem propriamente no melhor dos respectivos repertórios. Florência, que muitos apenas associam a duas joviais e despretensiosas cantigas parafolclóricas que alcançaram grande êxito – "Moda da Amora Negra" e "De Rosa ao Peito" –, é um desses casos paradigmáticos. João Carlos Callixto, na edição ontem emitida do seu programa "Gramofone" [>> RTP-Play], que consagrou por inteiro a Florência, falecida no passado 18 de Julho, teve a mui louvável preocupação de dar a ouvir alguns registos de conteúdo mais profundo e de padrão estético mais elaborado que ficaram na penumbra. E o blogue "A Nossa Rádio" preza em associar-se à homenagem a Florência, dona de uma voz de timbre muito belo e harmonioso, condizente com a sua bonita fisionomia, resgatando outro trecho poético-musical de verdadeira antologia que poucos dos visitantes deste sítio terão alguma vez ouvido: o primoroso fado "De Mãos Vazias", com letra e música, respectivamente, de José Guimarães e de Resende Dias, a parelha de autores que concebeu a maioria do repertório original de Florência (a artista também gravou, além de cantigas da tradição popular, um número apreciável de canções e de fados criados por colegas de ofício, com Amália em primeiro lugar). O mencionado fado foi primeiramente publicado no álbum "Florência Canta Fado" (Orfeu/Arnaldo Trindade, 1980) e incluído, vinte anos mais tarde, na compilação em CD dedicada à intérprete que integra a colecção Clássicos da Renascença editada pela Movieplay.
As palavras de José Guimarães, como é fácil de perceber, continuam bem actuais no presente mundo onde a maldade recrudesceu de modo despudorado e, ante ela, se impõe às pessoas de bem como absolutamente imperiosa a denúncia e – ainda mais importante! – a acção vigorosa e denodada para lhe pôr cobro. Porque ficar-se passivo, acomodado na indiferença ou tolhido pelo desânimo, é abrir mão da liberdade e renunciar à dignidade, condições essenciais ao ser humano. Boa escuta!
De Mãos Vazias
Letra: José Guimarães
Música: Resende Dias
Intérprete: Florência* (in LP "Florência Canta Fado", Orfeu/Arnaldo Trindade, 1980; CD "Florência", Col. Clássicos da Renascença, vol. 49, Movieplay, 2000)
De mãos vazias, sem nada de nada,
Um pouco de céu pretendo alcançar;
São os meus dias janela fechada
Onde não há madrugada,
Onde a luz não quer entrar;
Ai dos meus dias que são tudo e não são nada:
São liberdade amarrada,
São silêncios a falar.
Olhos fechados... para a maldade não ver;
Braços cruzados..., deixar a vida correr;
Lábios cerrados... e não dizer a verdade,
Mas ter voz e estar calada é perder a liberdade.
Meu grito aberto, meu grito calado
Eu atiro ao vento sem ninguém ouvir;
Longe e tão perto, princípio acabado
Onde o meu olhar cansado
Anda a sonhar sem dormir:
Tudo é deserto no meu sonho povoado,
Onde um povo amordaçado
Não sabe cantar nem rir.
Olhos fechados... para a maldade não ver;
Braços cruzados..., deixar a vida correr;
Lábios cerrados... e não dizer a verdade,
Mas ter voz e estar calada é perder a liberdade.
[instrumental]
Lábios cerrados... e não dizer a verdade,
Mas ter voz e estar calada é perder a liberdade.
* Florência – voz
António Chainho e José Luís Nobre Costa – guitarras portuguesas
José Maria Nóbrega e Francisco Gonçalves – violas de fado
Raul Silva – viola baixo
Amália Rodrigues, 1952, fotografada em Nova Iorque por Bruno Bernard, mais conhecido por Bernard of Hollywood, Museu Nacional do Teatro e da Dança (MNTD 199519) [Raiz].
Considerando a data averbada no assento de nascimento de Amália, que é a que, mesmo carecendo de exactidão cronológica, conta para efeitos burocráticos, a preeminente artista completaria hoje 105 anos de idade. Assinalamos a efeméride dando destaque a um fado da nossa particular afeição e que ela também tinha entre os seus predilectos (prova-o tê-lo gravado várias vezes e incluído em múltiplas actuações ao vivo): "Que Deus me Perdoe". Escolhemos a versão presente no álbum "Amália no Olympia" que corresponde a uma gravação ao vivo feita na mítica sala parisiense em Abril de 1956. Não foi ela quem escreveu a letra [tem a assinatura do poeta Silva Tavares (1893-1964), que a concebeu expressamente para Amália cantar, em Outubro de 1946, na opereta "Mouraria", evocativa da fadista oitocentista Maria Cesária], mas era como se tivesse saído do seu punho, tão esplendidamente exprime a sua alma fadista e define a sua personalidade e idiossincrasia artística. Segundo o testemunho de um dos espectadores da opereta, Vítor Pavão dos Santos, expresso no seu livro "Amália e os Poetas" (Bertrand Editora, 2014, p. 155), a artista não deu sinais de se deixar entusiasmar com as letras originais dos fados que Adelina Fernandes interpretara, duas décadas antes, na mesma opereta, entre os quais o "Fado da Cesária" [texto e áudio >> YouTube], o que bate certo com aversão amaliana a cantar versos com os quais não se identificasse, atitude que só abona a favor da sua dignidade de artista grande e autêntica. A sua interpretação de "Que Deus me Perdoe", essa foi empolgante e percebe-se muito bem que o tenha sido, porque Silva Tavares escreveu a letra a pensar menos na fadista Cesária do séc. XIX e mais em Amália que, aos 26 anos de idade, já era considerada a maior intérprete de fado de que havia memória.
Note-se na maneira superiormente inteligente como Amália canta este seu fado biográfico, com música de Frederico Valério, ajustando a voz ao sentido das palavras, contendo-a e só a alteando nos momentos em que a letra o pede, como acontece no dístico "Cantando dou brado / E nada me dói". E ali o seu portentoso brado justifica-se com a máxima propriedade! Uma lição de magistral interpretação que devia ser aprendida por certas cantadeiras (pretensamente fadistas) que por aí andam, cujo aparelho vocal é muito inferior do de Amália, e se esganiçam todas por dá cá aquela palha.
A talhe de foice, uma interrogação: está Amália acaso representada na 'playlist' da Antena 1? Temos sérias dúvidas de que sim, uma vez que nada do seu vastíssimo repertório lográmos apanhar nas incursões que ultimamente fizemos à emissão do canal generalista da rádio do Estado. A confirmar-se, a situação demonstra clamorosa leviandade e inconsciência da parte de quem administra a programação musical, pela simples razão de que o país tem uma colossal dívida de gratidão para com Amália – justamente por ter sido a maior embaixatriz da cultura portuguesa além-fronteiras e por ter legado a Portugal (e ao mundo lusófono, e não só) uma obra fonográfica de descomunal dimensão, em quantidade e qualidade.
Que Deus me Perdoe
Letra: Silva Tavares (para a opereta "Mouraria", 1946, Teatro Apollo, Lisboa)
Música: Frederico Valério
Intérprete: Amália Rodrigues* [in LP "Amalia à l'Olympia", Columbia/Les Industries Musicales et Electriques Pathé Marconi, 1957; LP "Amália no Olympia", Columbia/VC, 1970, reed. EMI-VC, 1988, Edições Valentim de Carvalho/Som Livre, 2008; CD "Amália no Olympia" (Remastered), Edições Valentim de Carvalho/iPlay, 2011; 5CD "Amália em Paris": CD 1, Edições Valentim de Carvalho, 2020]
[instrumental]
Se a minha alma fechada
Se pudesse mostrar,
E o que eu sofro calada
Se pudesse contar,
Toda a gente veria
Quanto sou desgraçada,
Quanto finjo alegria,
Quanto choro a cantar...
Que Deus me perdoe
Se é crime ou pecado,
Mas eu sou assim
E fugindo ao fado
Fugia de mim;
Cantando dou brado
E nada me dói;
Se é pois um pecado
Ter amor ao fado,
Que Deus me perdoe.
Quando canto não penso
No que a vida é de má,
Nem sequer me pertenço,
Nem o mal se me dá:
Chego a crer, na verdade,
E a sonhar – sonho imenso –
Que tudo é felicidade
E tristeza não há.
Que Deus me perdoe
Se é crime ou pecado,
Mas eu sou assim
E fugindo ao fado
Fugia de mim;
Cantando dou brado
E nada me dói;
Se é pois um pecado
Ter amor ao fado,
Que Deus me perdoe.
[instrumental]
Cantando dou brado
E nada me dói;
Se é pois um pecado
Ter amor ao fado,
Que Deus me perdoe.
Capa da 1.ª edição francesa do LP "Amalia à l'Olympia" (Columbia/Les Industries Musicales et Electriques Pathé Marconi, Jan. 1957)
Fotografia – Sabine Weiss
Capa da 1.ª edição britânica do LP "Amália at the Paris Olympia" (Columbia, 1957)
Capa da 2.ª edição francesa do LP "Amalia à l'Olympia" sob o título "Les succès d'Amalia Rodrigues" (Columbia/Les Industries Musicales et Electriques Pathé Marconi, 1965)
Capa da 3.ª edição francesa do LP "Amalia à l'Olympia" (Columbia/Les Industries Musicales et Electriques Pathé Marconi, 1967)
Capa da 1.ª edição portuguesa do LP "Amália no Olympia" (Columbia/VC, 1970)
Capa da nova edição portuguesa (remasterizada) em CD do álbum "Amália no Olympia" (Edições Valentim de Carvalho/iPlay, 2011)
Fotografia – Sabine Weiss
Capa da caixa (5CD + livro) "Amália em Paris" (Edições Valentim de Carvalho, 23 Jul. 2020)
Capa do livro "Amália at the Olympia", de Lila Ellen Gray (Col. 33 1/3 Europe, Nova Iorque: Bloomsbury, Ago. 2023)
Fotografia – Sabine Weiss
Super-Lua de 23 Jun. 2013 sobre a Igreja de Nossa Senhora do Castelo, em Sesimbra, fotografada por Miguel Claro às 21h:22
(in https://www.miguelclaro.com/).
Havendo dias mundiais ou dias internacionais para tudo e mais alguma coisa, seria de estranhar que a Lua não tivesse também um dia do mesmo jaez. E tem: 20 de Julho, por resolução aprovada pela Assembleia Geral da ONU a 9 de Dezembro de 2021 instituindo o Dia Internacional da Lua. O vigésimo dia do sétimo mês do ano não foi, como é fácil de intuir-se, escolhido arbitrariamente, pois corresponde à efeméride em que pés humanos – no caso, os de Neil Armstrong – pisaram pela primeira vez o solo lunar: 20 de Julho de 1969.
Sendo o património fonográfico português profusamente rico em canções, poemas recitados e peças instrumentais alusivos ao astro mais próximo da Terra (o seu único satélite natural), que a alumia nas noites de céu não nublado ou com poucas nuvens, pensámos destacar uma gravação de temática lunar à guisa de cortesia aos prezados visitantes do blogue "A Nossa Rádio". E qual escolher entre as tantas e boas que existem? Ora, dado que o presente mês de Julho é o do 105.º aniversário do nascimento de Amália Rodrigues – figura maior da cultura portuguesa da contemporaneidade –, achámos por bem deitar mão ao belo poema amaliano "A Lua", publicado no seu livro "Versos" (1997), na versão musicada e cantada por Amélia Muge e que é parte integrante do primoroso álbum "Amélia com Versos de Amália" (2014). Boa escuta!
Poesia escrita e/ou cantada por Amália merece ser cultivada em qualquer altura do ano, e por maioria de razão no mês do seu aniversário natalício, Julho (o averbamento na conservatória do registo civil situa o nascimento a 23, mas sabia-se que a bebé viera ao mundo uns quantos dias antes, o que levou a artista a datar o seu aniversário no primeiro dia do mês). Em tal conformidade, bem podia a Antena 1 tomar aquele pretexto para fazer de Julho, a cada ano que passa, um mês amaliano. O repertório em voz própria teria, obviamente, lugar de primazia na 'playlist' e aproveitava-se para dar a ouvir poesia de Amália que outros gravaram, quer na forma recitada quer na cantada. Na segunda modalidade, o citado álbum de Amélia Muge é, claramente, o supra-sumo.
A Lua
Poema: Amália Rodrigues (ligeiramente adaptado) [texto original >> abaixo]
Música: Amélia Muge
Arranjo: António José Martins e José Mário Branco
Intérprete: Amélia Muge* (in CD "Amélia com Versos de Amália", Amélia Muge/Leve Music, 2014)
Olha a Lua redondinha, [bis]
Tão redonda, coisa rara! [bis]
Nem lhe descubro a covinha
De cada lado da cara...
Anda cá, ó Lua Cheia [bis]
De cantigas p'ra me dar!
Nem o mundo faz ideia [bis]
Das cantigas ao luar...
Na lua já ando eu
Mesmo sem ter ido à Lua:
Meu amor é todo meu;
Meu amor, sou toda tua!
Lua no quarto minguante [bis]
Algum desgosto ela tem: [bis]
Foi cantiga de estudante
Que cantou p'ra mais alguém.
Lua Nova não se vê, [bis]
Anda de cara escondida; [bis]
Não me perguntem porquê
Que é uma pergunta atrevida.
Tantas cantigas de amor
Já terá ouvido a Lua:
Se as sabe todas de cor
Sabe a minha e sabe a tua.
[instrumental]
Será que de amores cresce [bis]
Lua no quarto crescente? [bis]
Ou será que a Lua desce
P'ra estar mais perto da gente?
As luas são separadas: [bis]
Quartos minguante crescente; [bis]
Já tem quatro assoalhadas,
Tem muito mais do que a gente. [bis]
* Amélia Muge – voz e viola braguesa
António Pinto – guitarras acústicas (cordas de nylon e de aço)
António Quintino – contrabaixo
Tatiana Rosa – flautas em Dó
(Amália Rodrigues, Da secção "Se me Quiseres Ver Descalça", in "Versos", Lisboa: Edições Cotovia, 1997 – p. 57-58)
Olha a lua redondinha
Tão redonda coisa rara
Nem lhe descubro a covinha
De cada lado da cara
Anda cá ó lua cheia
De cantigas p'ra me dar
Nem o mundo faz ideia
Das cantigas ao luar
Lua no quarto minguante
Algum desgosto ela tem
Foi cantiga de estudante
Que cantou p'ra mais alguém
Lua nova não se vê
Anda de cara escondida
Não me perguntem porquê
Que é uma pergunta atrevida
Será que de amores cresce
Lua no quarto crescente
Ou será que a lua desce
P'ra estar mais perto da gente
Tantas cantigas de amor
Já terá ouvido a lua
Se as sabe todas de cor
Sabe a minha e sabe a tua
Na lua já ando eu
Mesmo sem ter ido à lua
Meu amor é todo meu
Meu amor sou toda tua
As luas são separadas
Quartos minguante crescente
Já tem quatro assoalhadas
Tem muito mais do que a gente
Capa da 1.ª edição do livro "Versos", de Amália Rodrigues; coordenação, nota final e cronologia: Vítor Pavão dos Santos (Lisboa: Edições Cotovia, Out. 1997)
Capa da 7.ª edição do livro "Versos", de Amália Rodrigues; coordenação, nota final e cronologia: Vítor Pavão dos Santos (Lisboa: Livros Cotovia, 2005)
Capa da 9.ª edição do livro "Versos", de Amália Rodrigues; coordenação, nota final e cronologia: Vítor Pavão dos Santos (Lisboa: Livros Cotovia, Mai. 2018)
Capa do livro "Poems", de Amália Rodrigues; ed. e introd.: Rui Vieira Nery; trad.: Jamie Rising (Lisboa: Dilúvio, Out. 2022)
Ilustração – André Carrilho
Edição bilingue em português e inglês
Capa do CD "Amélia com Versos de Amália", de Amélia Muge (Amélia Muge/Leve Music, 2014)
Fotografia – Egle Bazaraite
Ilustrações – Amélia Muge
Design gráfico – Cristiana Serejo
Fotograma do telefilme "Balada do Atlântico", com dramatizações de Álamo Oliveira, realização de José Medeiros e produção de Bruges da Cruz para a RTP-Açores (1987).
João Carlos Callixto fez o serviço público de consagrar por inteiro a edição do seu programa "Gramofone", que ontem de manhã foi para o ar nas ondas da Antena 1, a homenagear seis figuras ligadas à música portuguesa (e não só) que recentemente nos deixaram: as fadistas Adelina Silva e Maria da Nazaré, o produtor Luís Jardim, o guitarrista Luís Fernando, o baterista Paulo Neto (do grupo Essa Entente) e o letrista/poeta Álamo Oliveira (1945-2025). Com letras/poemas da autoria do último, quem ouviu a emissão em directo ou se socorreu do arquivo na plataforma RTP-Play teve a oportunidade de escutar duas canções com música de Carlos Alberto Moniz: "Recados da Ilha", por Samuel (1979) [>> YouTube], e "Navegar o Teu Corpo", na voz do compositor (2020) [>> YouTube Music].
O blogue "A Nossa Rádio" faz questão de enaltecer a iniciativa de João Carlos Callixto – um dos mais sabedores, atentos e zelosos profissionais hodiernamente a laborar na rádio pública –, e aproveita o ensejo para reforçar a homenagem ao autor açoriano (terceirense) Álamo Oliveira, que, além de ter escrito letras/textos para serem musicados/cantados, distinguiu-se como poeta, ficcionista e dramaturgo com vasta obra publicada [>> bibliografia]. Fazemo-lo dando destaque à maravilhosa xácara "Os Piratas", que ele escreveu e Luís Gil Bettencourt musicou para o telefilme "Balada do Atlântico" (RTP-Açores, 1987) [Parte I >> RTP-Arquivos / Parte II >> RTP-Arquivos], realizado por José Medeiros, cujas dramatizações têm a avalizada assinatura precisamente de Álamo Oliveira. O trecho poético-musical em apreço foi também – e bem – objecto de edição fonográfica, primeiramente no LP homónimo (DisRego, 1987), com honras de abertura do alinhamento, e depois nas compilações "O Barco e o Sonho | Balada do Atlântico | Xailes Negros" (2LP, Philips/Polygram, 1989) e "7 Anos de Música (2.ª edição)" (CD, DisRego, 1992).
Vem a talhe de foice apontar o dedo acusador/reprovador a quem manda na programação musical da Antena 1 pelo vil ostracismo a que tem votado a música açoriana, quer a tradicional quer a de autor, ao negar-lhe a merecida e justa presença na 'playlist'. A fascinante xácara aqui apresentada é apenas uma das numerosas pérolas que já se criaram nas nove Ilhas de Bruma, preciosidades essas que por serem portuguesas não podem (não devem) ficar escondidas dos continentais.
Os Piratas
Letra: Álamo Oliveira
Música: Luís Gil Bettencourt
Intérpretes: Nélia Freitas, Carlos Medeiros, Henrique Ben-David, Henrique Álvares Cabral, Paulo Andrade e Luísa Alves [in LP "Balada do Atlântico", DisRego, 1987; 2LP "O Barco e o Sonho | Balada do Atlântico | Xailes Negros": LP 1, Philips/Polygram, 1989; CD "7 Anos de Música (2.ª edição)", DisRego, 1992]
[instrumental]
[A Donzela:]
— «Minha mãe, vinde ao balcão
Ver quem vem aí!
Pelo mar do nosso chão
Vêm barcos de roubar.
São corsários, são piratas,
Oh, valei-me aqui!
Ó pirata, porque matas
O que não te posso dar?»
[instrumental]
[1.º Pirata:]
— «Tenho sangue no meu peito
P'ra me lambuzar...»
[2.º Pirata:]
Esse corpo, amor-perfeito,
Quero-o bem dentro de mim.»
[1.º Pirata:]
— «Dou-te um par de arrecadas
P'ra te aliciar.»
[2.º Pirata:]
— «Tenho homens com espadas
P'ra me ajudarem no fim.»
[Os Piratas:]
— «Somos os piratas,
O terror do mar,
Os heróis da prata,
Oiro a nadar.
Somos gente que até gosta de roubar.
Somos os herdeiros
De aventuras vãs;
Fomos os primeiros
A romper manhãs,
E no corpo a tatuagem fica bem.»
[O Morgado:]
— «Ó corsário, ó ladrão,
Deixa-me a fazenda!
Não vês que isso é o pão
Dos meus filhos e mulher?
Sempre vivo em sobressalto
Por cada moenda...
Há navios no mar alto
Com o oiro que quiser.»
[1.º Pirata:]
— «Se me deres o que é teu
Vou-me logo embora...»
[2.º Pirata:]
— «Se te armares em judeu
Nem sequer o ar te deixo.»
[O Morgado:]
— «Senhor meu, a minha vida
Nada vale agora...»
[2.º Pirata:]
— «Tens a morte preferida...
Da escolha não me queixo.»
[Gente da ilha:]
— «São ladrões da terra!
São ladrões do mar!
Os senhores da guerra
De espadas no ar!
E um sorriso estampado no matar.
Querem nosso pão,
Querem nossas vidas.
São piratas, são!
São almas perdidas,
E não sabem que este medo vem do chão.
[instrumental]
[3.º Pirata:]
— «Há aqui um frade coxo
P'ra vos confessar...»
[A Religiosa:]
— «Ah, senhor, que não vos ouço,
Deixa-nos viver em paz!»
[2.º Pirata:]
— «Cara linda, minha freira,
Venho p'ra ficar
Aqui uma noite inteira...»
[3.º Pirata:]
— «O que já o satisfaz...»
[A Religiosa:]
— «Tenho medo, tenho medo
Desta tentação...»
[2.º Pirata:]
— «Posso até guardar segredo,
Juro à porta do sacrário:
Se trouxerem as alfaias
Para a minha mão,
Respeitarei essas saias
E a cruz do escapulário.»
[Os Piratas:]
— «Somos os piratas,
O terror do mar,
Os heróis da prata,
Oiro a nadar.
Somos gente que até gosta de roubar.»
[Gente da ilha:]
— «Querem nosso pão,
Querem nossas vidas.
São piratas, são!
São almas perdidas,
E não sabem que este medo vem do chão.»
[Todos:]
— «Foram outros ventos,
Cofres por abrir;
Foram outros tempos
Neste descobrir
Que os piratas continuam a existir.»
* Nélia Freitas – voz (A Donzela)
Carlos Medeiros – voz (1.º Pirata)
Henrique Ben-David – voz (2.° Pirata) e percussão
Henrique Álvares Cabral – voz (O Morgado)
Paulo Andrade – voz (3.º Pirata), percussão e cavaquinho
Luísa Alves – voz (A Religiosa)
Luís Gil Bettencourt – percussão e teclas
José Medeiros – percussão e teclas
Gil Alves – flauta
Direcção musical – Luís Gil Bettencourt e José Medeiros
Produção – RTP-Açores
Produtor executivo – Victor Toste
Gravado no Angel Studio, Lisboa, em Abril de 1987
Técnico de som – Jorge Barata
Técnico assistente – Luís Flor
Capa do LP "Balada do Atlântico" (DisRego, 1987)
Fotografia – Raul Resendes
Modelo – Luísa Madruga
Design – Luís Gil Bettencourt e Carlos Elias Rodrigues
Capa da compilação em duplo LP "O Barco e o Sonho | Balada do Atlântico | Xailes Negros" (Philips/Polygram, 1989)
Fotografia – Rui Martins (A partir de uma imagem de "O Barco e o Sonho" – Paint Box: António Luís Moniz)
Capa da compilação em CD "7 Anos de Música (2.ª edição)" (DisRego, 1992)
Ilustração – Michael Hudec
Design gráfico – Digiarte.